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Diálogos de um velho Cobridor – O Capelão

Diálogos de um velho Cobridor

Por Carl Claudy (1879-1957)

 Os “Diálogos de um velho Cobridor” são uma série de pequenas peças escritas pelo Ir∴ Carl Claudy no ano de 1924 que retratam, através do diálogo fictício entre um maçom com pouco tempo de iniciado e um maçom mais antigo e experiente, a visão de Claudy sobre a filosofia maçônica. São 70, no total, divididas em 7 capítulos. As questões tratadas nos diálogos são atualíssimas, mesmo tendo sido escritas há quase cem anos atrás. Tradução: Edgard da Costa Freitas Neto, M∴ M

 

Fui constrangido na Loja, esta noite!”, disse o novato para o velho Cobridor. “Não acho que o Mestre da Loja deveria me deixar dessa maneira!”

Isso é mau”, respondeu o velho Cobridor, subitamente simpático. “Ele te chamou a atenção por alguma razão?”

Oh, não. É que o Capelão faltara, e o Mestre me pediu para substituí-lo.”.

E por que isso deveria tê-lo constrangido?“, perguntou o velho Cobridor, ainda simpático.

Fiquei terrivelmente constrangido em dizer que não poderia.”

Ah, você se recusou?

Claro que sim! Meu embaraço já era grande o suficiente como estava, e ainda ter que ir para defronte ao altar para oferecer uma prece? Cara, não conseguiria fazê-lo!

Fico surpreso!“, respondeu o velho Cobridor. “Mas vamos em frente. Quem atuou como Capelão?

O Mestre pediu então para o palestrante da noite, algum irmão que eu nunca vira antes. Ele ofereceu uma bela oração, também. Eu o ouvi dizer ao Mestre que ele não sabia de cor a oração do Ritual, mas o Mestre disse que isso não importava, o que eu achei esquisito.“.

E você se lembra como foi a oração?” perguntou o Cobridor.

Muito bem, penso eu“, respondeu o maçom novato. “Não era muito comprida. Ele foi ao altar, se ajoelhou e então disse: ‘Todo-Poderoso Arquiteto do Universo, nós, como mestres maçons, de pé nesta Loja erigida à Vossa glória, humildemente rogo para desça Teu olhar para esta assembleia de Vossos filhos. Abri nossos corações para que as verdades eternas da Maçonaria possam penetrá-los, com o fim de que possamos fazer de nós pedras polidas aptas a tomar parte de Vossa visão para o grande Templo eterno em Vossos céus. Assim o pedimos, em nome do Olho-que-tudo-vê. Amém’“.

Uma bela oração“, respondeu o Cobridor.

Mas não era a do Ritual!“, objetou o novato.

De fato, mas ele também não era o Capelão originalmente designado…“, retorquiu o velho Cobridor. “E qual a diferença que faz, para Deus, se oramos desta ou daquela maneira em cada abertura da Loja?  Deve ser a sinceridade por trás da oração que conta, na opinião d´Ele, não as palavras exatas.  Mas ao se recusar a atuar como capelão parece que você se pôs numa má posição, hein? Você se barbeia, certo?

Por que? Err, quer dizer, sim! Mas o que tem isso a ver com a questão?

Amanhã de manhã, ao se barbear, você vai se olhar no espelho e vai dizer ‘Bom dia, covarde!’ e não vai ser legal, vai?

Você pensa que eu fui um covarde?” perguntou, melancolicamente, o novato.

Medrosão!“, sorriu o velho Cobridor. “Tão prepotente, tão cheio da ideia de todos os irmãos o admirarem que não poderia se perdoar, ou suportar a ideia, de eles diminuírem sua admiração. Claro que é covardia. Você se esquivou do dever por empáfia!

” Cobridor, você usa palavras duras! Não foi prepotência. Foi modéstia. Não me vi como capaz…

Não tente se enganar! Você me disse que estava constrangido. Por que um homem se constrangiria em público? Porque ele tem medo de que se não fizer certo, se não fizer uma boa apresentação, se não for bem sucedido, vai ser ridicularizado. Então você recusou a deferência que o Mestre lhe prestou e recusou aos seus irmãos o belo serviço de ser seu porta-voz

Mas eu nunca fiz uma oração em público!

Nem você nem nenhum outro homem jamais fez uma oração em público antes da sua primeira oração em público!”, sorriu o Cobridor. “Mas me diga, por que um homem se sentiria constrangido perante Deus? Nós não somos ensinados que Ele tudo sabe? Se nada podemos d’Ele esconder, Ele tudo sabe sobre ti.  Um homem pode sentir vergonha de si, pode se arrepender de quem é e de quem tem sido, mas constrangido, numa oração? Se sentir constrangido perante seus irmãos, isso é empáfia. Qualquer homem é páreo para um exército se ele tem Deus do seu lado. O homem que fala com Deus não tem nenhuma razão para temer outros homens. Se os homens riem, vergonha para eles. Em todos os meus muitos anos na Maçonaria nunca vi ninguém nem mesmo sorrir ou dizer uma palavra para ridicularizar qualquer um que tenha feito uma oração franca e sincera ao Grande Arquiteto do Universo. Nunca vi ninguém rir quando o capelão, titular ou substituto, faz sua oração a Deus. Não importa se a oração é a que está no ritual ou se saiu direto do coração, tenho certeza de que Deus a captou.  Sobre invocar o nome “Olho-que-tudo-vê”, que importa? É um bom termo, santificado pelos corações de gerações de homens e maçons.

Pela sua própria paz de espírito, diga ao seu Mestre que você cometeu um erro e que está arrependido, e que se ele lhe der a honra de uma oportunidade para orar para si e para seus irmãos, na ausência do Capelão, você dará o melhor de si. E quando você se ajoelhar perante o altar você irá esquecer, como qualquer outro Capelão, que a ninguém interessa a oração, senão Àquele para quem ela é endereçada!

Irmão Cobridor, vou tentar fazer isso!“, afirmou, convicto, o novato.

“Humpf!“, grunhiu o velho Cobridor.

Bruno Oliveira

Mestre Maçom da Loja Amizade, Trabalho e Justiça, Oriente de Umuarama/PR filiada ao GOP - COMAB. Senior Demolay e Past MC do Capitulo Umuarama nº133 da Ordem Demolay - SCODRFB. Past-Sumo Sacerdote do Capitulo Umuarama nº 43 de Maçons do Real Arco filiado ao Supremo Grande Capítulo de Maçons do Real Arco do Brasil e Membro Fundador do Conselho Zohar filiado ao Supremo Grande Conselho de Maçons Crípticos do Brasil.

One thought on “Diálogos de um velho Cobridor – O Capelão

  • Ademir Tomaz

    Excelente reflexão. Obrigado pela tradução e compartilhamento.

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